quarta-feira, 11 de agosto de 2010



“Sabemos que o jogo da arte não é só um jogo, que a compreensão e a criação caminham juntas.
Aqui, o jogo como sistema de representação não alheia ao conhecimento de que é expressão construtiva, regula-se internamente por processos de imaginação poética, atentos às dinâmicas do sistema cultural que o determina.
A simbolização aparece como modo de apreensão da realidade. Partilha com a ciência, a tarefa essencial, para uma mesma actividade cognitiva, de criar sistemas de símbolos, estando a diferença nos processos simbólicos utilizados.
Aqui o sistema não verbal é de referencia múltipla, indirecta e complexa e passível de interpretação não consensual.
Filipe Garcia voluntariamente ambíguo, problematiza questões fundamentais do âmbito da investigação cognitiva, numa estrutura semanticamente profunda a determinar as representações e as suas relações sintacticamente densas.
Encontramos na sua obra analogias e semelhança com o mundo físico da estrutura atómica e as suas leis e com o mundo psíquico. Nas questões que a obra permite encontramos a problematização da heterogeneidade da experiência espacial e da percepção no tempo em interacção íntima, como condições de possibilidade da experiência e sua inteligibilidade.
Reinterpretam-se as relações entre local e global na combinatória de um jogo puramente construtivo. afirma-se o mundo da experiência como totalidade aberta.
A sua expressão não é isenta de vínculos num diálogo entre a intuição livre e as leis formativas da arte a que se acrescenta a invenção de sua própria regra. Afirma-se aqui um jogo de correspondências, na estrutura visível da obra e todo o trabalho cultural que a antecede. Assim na construção da verdade que lhe corresponde encontramos a estrutura simbólica da sua versão dos mundos possíveis.
As possibilidades de existência de uma estrutura em que as noções de parte e de todo são intercambiadas, mostram-nos numa relação sem centro privilegiado, as formas que se vêm como padrões das forças que suportam a existência.
A expressão é intensa, nos limites da visibilidade, a unidade múltipla e articulada entre o linear e o pictórico, em contradições dinâmicas onde tudo se atrai ou repele, se homogeniza ou heterogeniza.
A linha modula uma espacialidade prévia que a metamorfose exige, nos seus diversos graus de actualização e potencialização relativas. Material complexo o que imerge no plano da composição, nas zonas de indeterminação, de indescernibilidade  que nos revelam as forças e os seus devires, numa heterogénese que nos restitui o infinito.
No seu modo de formar enunciam-se operando com intuição, as questões da construção da complexidade e da exigência de um repensar aquilo que nos pensa como composto de multiplicidades. Também a ordem dos coexistentes e as complexas dinâmicas do que se produz continuamente. O encontro do especulativo com o real num tactear feito de rupturas que tenta aceder a uma verdade depositada no mundo.
Filipe Garcia trabalha numa liberdade intelectual que prescinde da lógica clássica da não contradição e do terceiro excluído. Neste processo que nos inventa na condição experimental e afirmativa que pressupõe a libertação das possibilidades já dadas, esta um profundo vitalismo que não renuncia à sua distancia de ordem simbólica. Coisa mental, o objecto material que a manifesta é aqui traço aproximativo.
Quanto à linguagem para que a consciência tende acrescentar-se-á pelo uso e frequência das obras de arte e será sempre relação ao sentido (entendido problematicamente), àquilo que está implicada na nossa existência e aqui é o trabalho da sensação.”

L.C.C. 

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